Quando abordamos a momentosa questão da relação entre o homem e o mundo natural, não fazer nada ou interferir minimamente torna-se uma ideia radical. Especialmente para uma civilização como a nossa, obcecada em saltar de uma complexidade para outra na prática, ao mesmo tempo em que, teoricamente, idealiza a simplicidade.
Masanobu Fukuoka (1913 “2008) foi um agricultor, biólogo e filósofo japonês, autor das obras “A revolução de uma palha” e “O sendeiro natural do cultivo”, nas quais apresenta suas propostas para um método de agricultura que é hoje mundialmente conhecido como “agricultura natural” ou “método Fukuoka”. Esse sistema de cultivo, cujos resultados costumam ser surpreendentemente bons, é baseado justamente num ideal de simplicidade.
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No Japão, Fukuoka criou uma fazenda a partir de seus próprios conhecimentos e descobertas. Essa fazenda ficou célebre em todo o mundo por causa dos seus altos resultados agrícolas tanto em termos de produção e da alta qualidade dos vegetais ali cultivados quanto de preservação da qualidade do solo. Estes são os dois pontos que costumam ser destacados quando se fala da fazenda de Fukuoka:
1. Era mais produtiva por metro quadrado do que todas as plantações agroindustriais do mundo, incluídas as que empregam as mais modernas tecnologias.
2. Não empregava nenhum tipo de maquinário, nem pesticidas, nem adubos químicos. Nessa fazenda também não se arava a terra.

Fukuoka conseguiu tudo isso empregando técnicas pioneiras dentro do espírito da permacultura (sistema de design para a criação de ambientes humanos sustentáveis e produtivos em equilíbrio e harmonia com a natureza). A mais célebre das técnicas de Fukuoka é a das “nendo dango”, bolas de argila com sementes em seu interior.

Fukuoka participou de numerosos projetos de permacultura que alcançaram grande êxito ao redor do mundo. Por causa deles esse sábio japonês conquistou a fama de ser capaz de reverdecer campos áridos e até mesmo zonas desérticas. Ele entendia seu trabalho não apenas como um labor de cura da Terra, mas também de cultivo da alma.
Projeto Fukuoka
O sistema de cultivo de Fukuoka foi por ele batizado de “agricultura natural”. Embora muitas das suas práticas sejam específicas para o Japão, a ideia geral que rege o seu método foi aplicada com êxito em muitos lugares ao redor do mundo. Seu sistema se enquadra dentro do âmbito da permacultura, cuja essência é reproduzir as condições naturais tão fielmente quanto possível, de modo que o solo se enriqueça progressivamente e a qualidade dos alimentos cultivados aumente sem o acréscimo de nenhum esforço ulterior.
Princípios do método
  1. Não arar: deste modo são preservados e mantidos a estrutura e a composição do solo com suas características ótimas de umidade e de micronutrientes.
  2. Não usar adubos ou fertilizantes: mediante a interação dos diferentes elementos botânicos, animais e minerais do solo, a fertilidade do terreno de cultivo se regenera como em qualquer sistema não domesticado.
  3. Não eliminar ervas daninhas nem usar herbicidas: estes destroem os nutrientes e os microrganismos do solo, e unicamente se justificam em certos casos de monoculturas. Fukuoka propõe uma interação de plantas que enriquece e controla a biodiversidade de um solo.
  4. Não usar pesticidas: eles também matam a riqueza natural do solo. A presença de insetos pode ser equilibrada numa plantação.
  5. Não podar: deixar que as plantas sigam o seu curso natural.
Todos estes princípios de trabalho à primeira vista bastante radicais são baseados na antiquíssima filosofia oriental do não fazer (wu-wei, em chinês) ou, mais exatamente, não interferir. Fukuoka alcançou um alto grau de compreensão dos microssistemas do solo, que lhe permitiu idealizar um sistema que libera do trabalho e dos esforços não necessários empregados na agricultura convencional moderna.
Seu método se baseia em dar e receber da terra de forma natural, em vez de sugar os seus recursos até o seu total esgotamento.
As bolinhas de barro, com sementes, podem ser feitas de modo artesanal, com o uso das mãos
Para melhorar a produção com a menor intervenção possível, Fukuoka idealizou entre outras coisas um sistema que permite substituir tanto o arado quanto os espantalhos.
Uma criação importante é o das bolinhas de barro: colocar sementes dentro de bolinhas de barro de 2 a 3 centímetros de diâmetro que serão espalhadas na superfície do campo agrícola. No interior das bolinhas, as sementes permanecerão protegidas das intempéries e dos animais. Com as primeiras chuvas intensas, as bolinhas serão desfeitas e as sementes começarão a brotar.
Misturadas às sementes das plantas que se deseja cultivar são incluídas sementes de outras plantas (principalmente do trevo branco). Estas últimas germinarão mais rapidamente e suas plantas criarão uma capa fina que protegerá o solo da luz solar, impedindo a germinação de ervas daninhas, mas não a dos cereais que se deseja cultivar.
Em vez de arar ou eliminar as ervas do campo agrícola, o método Fukuoka recomenda que ele seja recoberta com os restos das plantas cultivadas na colheita anterior, de forma que seja criada uma compostagem natural, capaz de conservar a umidade e os nutrientes e de impedir a proliferação de ervas não desejadas.
Detalhes interessantes
As bolas de argila podem conter uma porção de adubo natural (esterco ou outros).
Uma porção de pimenta caiena acrescentada às bolotas de barro ajuda a espantar animais que poderiam comer as sementes.
Nessas bolotas podem também ser incluídas várias combinações, segundo seja o cultivo de cereais, hortaliças, frutas, zonas de bosques, etc., de modo que possam ter muito mais usos que o da produção de alimentos agrícolas (reflorestamento, renovação de áreas verdes, regeneração de solos desgastados, etc.)
Sistema de trabalho
O sistema Fukuoka se baseia em respeitar e inclusive potencializar os ciclos naturais, de maneira que estes assegurem uma melhor qualidade de crescimento das plantas. Mediante intervenções simples, executadas no momento adequado, é possível obter-se uma considerável redução do tempo de trabalho. Essas intervenções são baseadas na interação da biosfera com o solo. Por exemplo: no outono semeia-se arroz, recoberto com uma espessa camada de palha de arroz. O centeio ou a cevada e o trevo brotam imediatamente, mas as sementes do arroz permanecem latentes até a chegada da primavera. O centeio e a cevada são ceifados em maior e permanecem espalhados sobre o terreno para que sequem durante uma semana a dez dias.
Depois disso, são triados e ensacados para armazenamento. Toda a palha é espalhada sem trituração sobre os campos, como para formar um acolchoado. Os campos permanecem inundados durante um curto período de tempo durante as chuvas das monções de junho para debilitar o trevo e as ervas daninhas, e dessa forma proporcionar ao arroz a oportunidade de brotar através da capa vegetal que cobre o solo.

A filosofia de vida de Fukuoka
“Se não tivesse criado para mim uma filosofia de vida, já estaria morto há muitos anos”, costumava afirmar Fukuoka. “Uma única coisa é absolutamente verdadeira: Tudo é uno. Também descobri que nada existe neste mundo. Tentei penetrar cada vez mais nos detalhes do NADA mais profundo”.